A coordenadora técnica do projeto Mapa da Inclusão Digital, do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), Anaiza Caminha Gaspar, participou de uma audiência pública na Comissão sobre Lan House, na Câmara dos Deputados, no mês de maio de 2010, em Brasília. O tema debatido foi a avaliação da infraestrutura e dos equipamentos dos centros de Inclusão Digital. Anaiza Gaspar proferiu a palestra “Mapa da Inclusão Digital no Brasil (MID): resultados de Pesquisas sobre Centros Públicos de Acesso Pagos e Gratuitos - Infraestrutura e Equipamentos”, com ênfase na ferramenta que o IBICT disponibiliza para os estados, objetivando que eles tenham os próprios mapas de inclusão digital.
Participaram do debate o presidente do IBGE, Eduardo Pereira Nunes; o presidente da Associação Rede GlobalInfo de Provedores, Magdiel da Costa Santos; o presidente da Associação Nacional para Inclusão Digital (ANID), Percival Henriques de Souza; e o diretor de Centros de Inclusão Digital – Lan Houses e similares da Brasscom. O presidente da Comissão sobre Lanhouse é o deputado Paulo Teixeira, sendo relator o deputado Otávio Leite. Leia a seguir a entrevista com a coordenadora do MID:
Comunicação Social – Como teve início o Mapa da Inclusão Digital elaborado pelo IBICT?
Anaíza Gaspar – O IBICT foi o primeiro órgão do governo federal a destacar o fenômeno das lan houses como um dado importante para a inclusão digital. Em 2007, o instituto iniciou uma conversa com o presidente da Associação Brasileira de Centros de Inclusão Digital (ABCID), Mário Brandão, para definir o escopo da pesquisa cujos resultados estão sendo discutidos hoje. As pesquisas divulgadas pelo Comitê Gestor da Internet apontavam que a inclusão das classes D e E, menos favorecidas, dava-se por meio das lan houses.
Comunicação Social – O que significa o termo lan house?
Anaíza Gaspar - O termo “lan house” ou “lanhouse" aparece preponderantemente no Brasil, até pouco tempo, como um local de jogos, e não de acesso à Internet. Isso pode indicar tanto uma falta de estudos sobre esses locais, como falta de compreensão do conceito de inclusão digital pela via dos jogos e do entretenimento em geral, e ainda uma efetiva diferença entre o caso brasileiro e o de outros países. Adotamos o termo usado pelo CETIC/CGI.Br lanhouse para identificar os centros públicos pagos de uso do computador e acesso à Internet, à semelhança dos chamados cyber cafés, distinguindo da designação operacional de Local Area Network (lan house), que neste caso é um acrônimo.
Comunicação Social - Como teve início a pesquisa do MID?
Anaíza Gaspar – O nosso interesse por lan houses veio exatamente do fato de querer saber como a iniciativa privada poderia ser uma aliada importante para o governo, no grande objetivo de promover a inclusão digital para parcelas significativas da população brasileira e ainda, como poderia ser feita de forma sustentável para garantir o surgimento de novos e pequenos negócios. Naquele tempo, pesavam sobre as lan houses sérias restrições como casa de jogos eletrônicos, e a imprensa divulgava notícias freqüentes associando lan houses a locais de contravenção. As pesquisas do CGI começaram a revelar um quadro diferente - as pessoas não estavam nas lanhouses apenas para jogar, e sim, para resolver problemas de acesso à internet, seja buscando emprego pela rede mundial de computadores, acessando uma página sobre determinado concurso público, imprimindo e mandando currículos por e-mail, entre outros motivos.
Em 2007, o IBICT começou a trabalhar esse tema, quando sofremos algumas pressões e questionamentos do tipo: como é que o Mapa da Inclusão Digital de uma instituição do governo federal se preocupa com centros de acesso de caráter pago? Nós fomos conversar com o CGI e entendemos, naquele momento, que partilhávamos da mesma preocupação que dizia ser muito importante avaliar o papel da iniciativa privada na inclusão digital. Discutimos também com consultores independentes da Unesco, que patrocinou um estudo sobre lanhouse em 2005, com foco em sustentabilidade dos projetos de inclusão digital, incluindo dados e entrevistas com lan houses/cyber cafés que operavam como atividades secundárias associadas a lanchonetes, papelarias, etc.. Experiência de políticas públicas de outros países mostrava que o Canadá, em 1994, lançou o programa Community Access Program (CAP), com foco em comunidades rurais e remotas de 50 mil habitantes, e expansão para comunidades urbanas em 1999. 0 Reino Unido incluiu os cyber cafés em políticas públicas, em meio aos espaços públicos de acesso. Venezuela, Argentina, Índia e países da África incentivaram pequenos e microempreendedores locais a oferecer serviços, nestes casos, não prestados ou mal prestados pelo Estado, incluindo a telefonia básica.
Comunicação Social – O que foi feito em termos de pesquisa MID/IBICT?
Anaíza Gaspar – Três pesquisas foram realizadas sobre o funcionamento dos centros de inclusão digital, utilizando um só instrumento para centros de acesso público gratuito e pago. Tivemos assessoria do IBGE, parceria com a ABCID e apoio do governo do Maranhão. A pesquisa do MID Brasil ficou disponibilizada no site do IBICT, de 2007 a 2008, e durante esse tempo foi feito um censo no estado do Maranhão. Na pesquisa chamada MID Brasil, preenchida no site do Ibict, compareceram PIDS de acesso gratuito (1.272) maiores do que os de lan houses (1.175). Há maior presença de telecentros (75%) do que de laboratórios de informática (25%), totalizando 7% dos PIDs cadastrados no MID. O MID Maranhão (censo) mostrou maior presença de lan houses (1.357) do que PIDS de acesso gratuito (1.144), no total de 2.501 PIDs, e também maior presença de laboratórios de informática (40%) do que de telecentros (6%). Os resultados mostravam maior concentração de todos eles no interior.
Comunicação Social – Quais os principais resultados a serem destacados nessas pesquisas?
Os resultados mais importantes mostram que os PIDs de acesso pago dispõem de computadores praticamente todos conectados à Internet. Isso indica que, mesmo em lan houses onde há grande foco em jogos, o acesso à Internet é hoje condição básica para a instalação de um PID pago. O número médio de computadores por PIDs com acesso (12 computadores), ao ser modulado pela disponibilidade de espaço físico para novos computadores, mostra que a quantidade mais freqüente (33%) está entre seis e dez computadores por PID. Há uma parcela significativa (29%), em que existe espaço para menos de seis computadores, indicando a existência de muitos pequenos negócios sendo criados, com poucos recursos para expansão. É notável que a maioria dos PIDs (mais de 60%) afirme que tem condições de receber seis ou mais novos computadores.
Há grande demanda pelos serviços nos PIDs já existentes, com os 17% de PIDs pagos recém-instalados (menos de seis meses no mesmo local); há flexibilidade em incorporar mais e mais máquinas, o que implica mais espaço, mais suporte técnico, mais energia elétrica, maior largura de banda etc. Apenas 8% asseguraram não ter condições de expansão, e mais de 17% disseram ser capazes de absorver mais do que 16 novos computadores. No MID Maranhão, encontrou-se que os telecentros têm em média maior número de computadores com conexão (10) do que as lan houses (7). Mas quando se trata dos sem conexão, enquanto as lanhouses têm menos de 1 (0,3), nos telecentros a média chega a quase 7 (6,8). O negócio das lan houses não funciona sem computadores conectados. E nos laboratórios de informática, a situação é preocupante: para quase 6 conectados (5,7), existem quase 5 desconectados (4,9). Os resultados completos da pesquisa estão disponíveis no site: inclusao.ibict.br
Comunicação Social – Você pode contar um pouco sobre a pesquisa realizada no Maranhão?
Anaíza Gaspar – A pesquisa, com apoio do governo do Maranhão, foi feita de forma censitária, de porta em porta. Foi constatado que em 1.144 PIDs de acesso gratuito, quase metade deles encontrava-se fechada (“inativos”), sem condições de atendimento público: laboratórios de informática: 51%; telecentros: 32%; 11 municípios apresentam-se com todos os PIDs inativos. Tendência a que a maior parte se distribua justamente onde há menos PIDs por município. Em 1.357 PIDs de acesso pago (lan houses), cerca de apenas um em cada 38 (ou 2,65% do total) encontrava-se fechado. A grande razão para isso estava atrelada à questão da sustentabilidade, equipamentos quebrados ou ainda não instalados. É interessante observar que, no Maranhão, o indicador de criação e renovação da base instalada é mais favorável do que na pesquisa MID Brasil, mostrando um esforço recente do governo, naquele período, para avançar na melhoria das suas instalações. No MID Maranhão os computadores com menos de um ano representam 41% nos laboratórios de informática e 29% nos telecentros. O indicador de desgaste da base instalada está mais fortemente presente na pesquisa MID Brasil onde os computadores com mais de 4 anos representam 58% nos Laboratórios de Informática e 43% nos telecentros, mostrando também que os estados que saíram na frente com programas e projetos de inclusão digital necessitam renovação de equipamentos.
No Caso do Maranhão, vale lembrar que o estado havia iniciado um programa modelar operado pela Univima (Universidade Virtual do Maranhão), que era responsável por atividades de ensino a distância, atingindo boa parte da necessidade de interiorização de formação de competências para os programas de desenvolvimento regional. Outra iniciativa que se destaca no Maranhão é o Programa Jovem Cidadão, que atua na baixada maranhense, uma das regiões mais pobres do estado; é de responsabilidade de uma ONG, indo muito além da inclusão digital e fornecendo bases para o protagonismo juvenil cultural e político.
Comunicação Social – Que conclusões pode-se tirar das pesquisas de Inclusão Digital do MID?
Anaiza Gaspar - A grande lição que se tira de tudo isso é que é muito difícil para o governo bancar sozinho a inclusão digital no país. É complicado, pois ele faz a inclusão por meio de um convênio com municípios ou entidades locais, patrocinando os custos iniciais de equipamentos, e esses projetos são frequentemente intemporridos quando mudam os dirigentes do governo local. Quando o telecentro é inaugurado, há muita publicidade, mas ninguém comenta quando ele não está funcionando ou se encontra fechado. O problema é que, mesmo fechado, o telecentro consta nas estatísticas como um telecentro em funcionamento. Portanto, a realidade é mascarada. Existe alto desconhecimento de vínculos com instituições governamentais apoiadoras de programas de inclusão digital: 69% dos respondentes disseram não ter “vinculação institucional”, considerando que lá na ponta não se sabe quais programas apoiaram o projeto instalado. Entretanto, grande quantidade de lan houses está surgindo como novos negócios de pequenos e microempreendedores. A vinculação institucional mais significativa delas é a “estabelecimentos comerciais”. E a segunda é a vinculação a “residências”, encontrando-se esta qualificação espalhada por diversos estados em 31% dos casos. O que significa isso? Há grande demanda por inclusão digital atendida por estabelecimentos comerciais que funcionam na informalidade, em residências particulares. O que pode ser feito? Estabelecer políticas públicas que apoiem a complementaridade entre lan houses e telecentros, ampliando sua a capilaridade para fornecer acesso via internet aos serviços públicos essenciais e disseminar oportunidades de treinamento para a população. Na verdade, o governo começa a utilizar a rede das lan houses - incluídas como locais de inscrição em editais de concursos públicos -, em um reconhecimento de seu papel como ponto de presença e comunicação com públicos diversos.
Núcleo de Comunicação Social do IBICT
14/05/2010
Data da Notícia: 17/05/2010 15:50
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