Diretores de 16 Unidades de Pesquisa (UPs) assinaram carta para o astronauta Marcos César Pontes, titular do agora Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI). O documento expressa a profunda preocupação desses institutos com cortes orçamentários anunciados para as UPs a partir do ano que vem.
A seguir, a íntegra da carta.
Brasília, 10 de junho de 2020
Exmo. Senhor
MARCOS CÉSAR PONTES
Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações - MCTIC
Esplanada dos Ministérios, Bloco E
CEP 70067-900 - Brasília - DF
Senhor Ministro:
Nós, diretores das Unidades de Pesquisas do MCTIC, trazemos ao seu conhecimento a nossa insegurança e preocupação diante da potencial diminuição dos orçamentos propostos para as unidades para o próximo ano. Entendemos que o Ministério tem realizado um grande esforço para prover os recursos para nossa sobrevivência; no entanto, estes cortes causam grandes aflições sobre a manutenção e a própria existência de alguns dos nossos institutos.
Há, hoje, um consenso no mundo da política, no mundo empresarial e na sociedade como um todo, de que o desenvolvimento da ciência é o principal patrimônio de qualquer país. Não só apenas pelos valores culturais que ele traz para a humanidade, mas também pela percepção de que é o instrumento fundamental para a segurança sanitária, segurança alimentar, para a defesa e o principal insumo para se criar riqueza e bem-estar para uma sociedade.
Ultimamente, em consequência da pandemia da covid-19, a palavra ciência é uma das mais citadas em noticiários, declarações e em quase tudo que se refere à presente situação. No entanto, nem passamos ainda pela crise e já voltamos a negligenciar os investimentos em ciência, sob a alegação de que “não há dinheiro”. Mas reafirmamos que uma das razões pelas quais não há – e não haverá dinheiro – é que os investimentos em ciência foram historicamente – e seguem sendo – inadequados, tomando como referência o tamanho da economia brasileira e o papel protagonista que o Brasil deveria assumir, mais vigorosamente, no cenário científico, tecnológico e da inovação.
Um país com as dimensões do Brasil, com seus desafios e suas oportunidades, para ter uma economia competitiva no cenário internacional – e, mais ainda, com o destino de país continental e, consequentemente, com as responsabilidades intrínsecas dessa estatura – tem que ter uma infraestrutura científica robusta e moderna, lastreada em institutos de pesquisas (em especial, os do MCTIC), bem como em universidades, complementada pela pesquisa empresarial, formando um consistente sistema integrado de CT&I.
A pesquisa universitária tem sofrido com a fragilização das agências de fomento, bem como a falta de recursos e bolsas para a formação científica. Mas o outro componente do sistema – o conjunto de institutos de pesquisas, que tem papel estratégico nas políticas públicas – tem se tornado ainda mais frágil.
Temos reiterado, repetidamente, que vivemos no Brasil, onde, por razões históricas, há um contraste marcante com a prática científica de grande número de países. Nos países que têm situação econômica próspera, há um balanço entre o número de cientistas atuando em universidades e institutos de pesquisas. Esse equilíbrio é chave para sua competência no desenvolvimento em C&T e, principalmente, em inovações. No Brasil, porém, essa relação é bastante desequilibrada – sem que sequer se possa argumentar que haja muitos cientistas trabalhando nas universidades.
O trabalho dos cientistas em universidades e institutos de pesquisas é complementar, mas com importantes diferenças. Enquanto, na universidade, cientistas têm a liberdade acadêmica como norteador de suas agendas de pesquisas, nos institutos, nosso trabalho está alinhado às missões especificas de cada instituição. Por sua vez, essas missões, alinhadas às estratégias e políticas públicas do Estado, têm como foco resolver os grandes desafios científicos e tecnológicos, com que se confronta a nação. Por exemplo, neste momento, cabe à Fiocruz, instituto associado ao Ministério da Saúde, coordenar todo o trabalho de pesquisa associado à pandemia no Brasil.
Os institutos de pesquisas têm o papel de gerar novas tecnologias com o objetivo de atender aos desafios científicos impostos ao país e deveriam ser centros de treinamento avançado para quadros técnicos que, depois de um tempo em ambiente científico, levam essa cultura para o meio empresarial. É assim que funciona em grande número de países.
Poderíamos listar aqui as contribuições importantes que o grupo de instituições de pesquisas associadas ao MCTIC trouxe ao país; porém, lembramos que já vamos para décadas de orçamentos reduzidos e quadro de pessoal sendo degradado em seu número. Em grande parte dos nossos institutos, se aplicarmos índices de correções monetária sobre um orçamento – que já era escasso, há uma década – e comparamos com o atual, chegamos a parcos 30% daquele valor, isso sem contar com a proposta atual de redução de orçamento, que inviabilizará atividades fundamentais de suas missões e sua própria subsistência. Vivemos hoje o paradoxo de que a redução de nossos orçamentos acabará por custar mais ao país do que pequenos aumentos que apontem para a direção de uma correção no papel que é da responsabilidade dos nossos institutos. Reiteramos, novamente, que a grande questão para nossas instituições não é o que fazemos – o que já representa muito se comparado com países desenvolvidos e respectivas relações de orçamentos –, mas, sim – de muito maior valor –, o que poderíamos fazer, com recursos suficientes.
Ao persistirem os cortes, propostos para a PLOA 2021 nos institutos do MCTIC, o país não fará nenhuma economia significativa, mas, sim, colocará em maior nível de risco uma componente importante para melhorias em seu resultado econômico em curto e médio prazos.
Finalmente, cabe a nós diretores alertar o MCTIC de que o fortalecimento da infraestrutura e operacionalidade dos seus institutos de pesquisas é um desafio importante e permanente para qualquer governo interessado em promover novos níveis de economia e bem-estar da nação brasileira.
Aproveitamos a ocasião para expressar nosso apreço pelo esforço que o Sr. tem realizado ao longo de sua gestão no sentido apontado no nosso texto. Esperamos que esses argumentos possam contribuir para convencer a presidência da República e o Congresso Nacional sobre a urgência em rever os orçamentos previstos para 2021.
Com toda a nossa consideração, expressamos nossas cordiais saudações
Ronald Cintra Shellard CBPF |
Darcton Policarpo Damião INPE |
Osvaldo Luiz Leal de Moraes CEMADEM |
Mônica Tejo Cavalcanti INSA |
Fernando Antonio Freitas Lins CETEM |
Fernando Cosme Rizzo Assunção INT |
Giovanna Machado CETENE |
Wagner José Corradi Barbosa LNA |
Jorge Vicente Lopes da Silva CTI |
Augusto César Gadelha Vieira LNCC |
Cecilia Leite Oliveira IBICT |
Anelise Pacheco MAST |
Sérgio Lucena Mendes INMA |
Ana Luisa Kerti Mangabeira Albernaz MPEG |
Antônia Maria Ramos Franco Pereira INPA |
João Carlos Costa dos Anjos ON |
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