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Sexta, 13 Novembro 2020 10:55

Mulheres na vanguarda do PPGCI: Entrevista com a professora Célia Ribeiro Zaher

Arte: Victor Silva Arte: Victor Silva

Entre os principais nomes que marcaram a história da Ciência da Informação no país está a professora Célia Ribeiro Zaher. A longa carreira de Célia Zaher perpassa toda a trajetória da Ciência da Informação no Brasil e a criação do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação, o PPGCI (convênio entre o Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia, Ibict, e a Universidade Federal do Rio de Janeiro, UFRJ), em 1970. Em entrevista exclusiva para o site do Ibict, a professora Célia Zaher conta um pouco sobre o caminho de tantos anos de dedicação à ciência.

Doutora em Direito do Trabalho pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1967), especialista em Library Science pela Columbia University (1963) e graduada em Biblioteconomia pela Biblioteca Nacional (1962), Célia Zaher foi professora do Curso de Documentação Científica do Instituto Brasileiro de Bibliografia e Documentação (IBBD), o antigo Ibict, de 1954 a 1970. A professora também foi presidente do IBBD entre os anos 1968 e 1972, além de diretora da Biblioteca Nacional (1982-84) e recentemente de 1997 a 2005. De 1991 a 1996, foi diretora do Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde (BIREME).

Célia Zaher ocupou o cargo de Coordenadora de Ensino e Pesquisa, Ciência e Tecnologia da Informação do Ibict, concomitantemente com a coordenação do PPGCI/Ibict/UFRJ, entre os anos 2008 e 2011. Atualmente, Célia Zaher é professora titular aposentada da Universidade Federal Fluminense (UFF) e aposentada da UNESCO, onde atuou como diretora de diversos departamentos, como biblioteconomia, informação, cultura, audiovisual, intercâmbios culturais e comunicação.

Confira a entrevista!

Ibict: Poderia contar sobre o início da sua formação profissional e acadêmica? Por que a senhora escolheu a graduação em Biblioteconomia? Era uma paixão?

Célia Zaher: No início, não era uma paixão. Meu pai e meu avô eram formados em Direito e era o caminho que eu inicialmente pretendia seguir. Quando eu tinha 17 anos, comecei a buscar minha independência financeira e decidi procurar um emprego. Nessa busca, encontrei uma vaga na biblioteca da UFRJ. Quando cheguei lá, eu era a única funcionária e depois passei a ser a chefe de mim mesma. Era uma biblioteca enorme! Comecei trabalhando diretamente com a inscrição dos livros que entravam na biblioteca. Nessa época, a doutora Lídia Sambaqui era a coordenadora e estava tentando organizar a biblioteca. Quando eu fui apresentada a ela, lembro-me que ela disse: “O que vocês esperam que eu faça com essa menininha?”. Foi uma ducha de água fria e, claro, algo perfeitamente normal no momento em que eu comecei a trabalhar na biblioteca, pois não tinha experiência profissional. 

Com o tempo, foram agregados mais profissionais à biblioteca da UFRJ, os quais começaram a atuar com a catalogação, bem como outros trabalhos. Depois dessa experiência, gostei da área e resolvi me inscrever no curso de Biblioteconomia, que, na época, era na Biblioteca Nacional. Posteriormente, consegui uma bolsa para estudar nos Estados Unidos e pude prosseguir com os meus estudos. Quando retornei, já tinha uma base profissional e acadêmica muito boa e passei a trabalhar no Ibict, no ano 1955. 

Ibict: Qual foi a atuação da senhora em relação aos anos iniciais da Ciência da Informação e do PPGCI? Poderia falar também sobre as dificuldades enfrentadas?

Célia Zaher: Quando eu voltei do período em que passei fora do país, a Hagar Espanha Gomes, que já ocupou o cargo de presidente do IBDD, se interessou também pelo assunto e começamos a estudar juntas. Escrevemos em 1972 um artigo que foi publicado na Revista Ciência da Informação sobre o que era essa ciência (clique aqui para ler o artigo). Daí em diante, a área começou a crescer. Nessa época, os bibliotecários tinham dificuldades de aceitar, desde a época do Curso de Documentação Científica, que pessoas de outras áreas trabalhassem com a área de informação. No ano 1968, foi realizado um seminário na área da informática com ideias de que a informática teria um papel preponderante nas bibliotecas. Aos poucos, verificou-se que o conceito de biblioteconomia era muito mais amplo. Diante das mudanças e desafios no campo, foi criado o PPGCI.

Ibict: Quais os futuros possíveis que a senhora enxerga para a Ciência da Informação?

Célia Zaher: Eu acredito que no futuro, cada vez mais, as bibliotecas vão ser voltadas e dedicadas para a questão do acesso e cada vez menos para o tratamento dos próprios documentos, os quais serão fontes de informação. Hoje em dia, já temos a digitalização de livros e documentos. A formação de redes para digitalização de livros e materiais é a nova tendência. O usuário não tem se importado mais com o fato de que esse acesso seja digital. O Brasil, para formar os seus profissionais, tem que acompanhar as mudanças que estão acontecendo. Por exemplo, as mudanças na história do PPGCI nos últimos anos revelam que a Ciência da Informação é muito mais abrangente do que pensamos. 

Ibict: Uma das linhas do trabalho do Ibict é a divulgação e o fortalecimento da Ciência Aberta. Como a senhora avalia a Ciência Aberta?

Célia Zaher: É uma tendência que está crescendo. Precisamos disseminar a ideia de que é importante compartilhar e não criar isoladamente ou não tentar fazer atividades científicas duplicadas. É preciso que sejam estabelecidas redes em Ciência Aberta e, para isso, as grandes universidades devem tomar a frente dessa temática. As universidades ainda não estão conscientes do importante papel que elas desempenham para a promoção da Ciência Aberta. Vemos por enquanto muitos esforços individuais de pesquisadores e instituições em todo o mundo. O Ibict tem atuado muito nas áreas técnicas e de divulgação da Ciência Aberta, mas ainda são necessários muitos recursos e investimentos de alto porte, bem como o reconhecimento de que essa não é uma tarefa que é individual, mas sim coletiva.

Qual a importância do PPGCI para a Ciência da Informação no Brasil? A senhora poderia contar sua história e a relação com o PPGCI?

Célia Zaher: O PPGCI mudou a história da Ciência da informação no Brasil, colaborando para a disseminação do conhecimento. O PPGCI teve diversas fases, mas duas delas foram fundamentais. Uma delas foi a própria criação do PPGCI, e a outra foi uma reforma do programa, que ocorreu em 2008. Quando assumi a presidência do antigo IBBD (1968-1972), a preocupação era o destino dos Cursos de Documentação Científica, que tinham prestado uma contribuição enorme. Chegou um momento nos cursos em que percebemos que era necessário aumentar nossos conhecimentos na área. A responsabilidade do então IBBD naquela época era liderar algo que fosse novo e moderno na Ciência da Informação. 

Percebemos, então, que seria necessário trazer professores de outros países de universidades renomadas para o mestrado em Ciência na Informação, com o objetivo de formar nosso próprio corpo de professores brasileiros. Para implementar essa ideia eram necessários recursos. Recorremos à ajuda de órgãos de apoio de ensino e pesquisa. Na ocasião, houve o apoio da Embaixada Britânica, da CARI Foundation e da Ford Foundation. Foram selecionados professores de instituições renomadas de biblioteconomia, que vieram para o Brasil atuar no PPGCI. Na época, o curso tinha dois obstáculos muito grandes. Um deles é que não tínhamos material didático necessário e precisamos de ajustes para isso acontecer. O outro desafio era começar esse curso de formação. Nesse primeiro curso, com o intuito de formar professores no Brasil, foram incluídos os diretores das diferentes sessões do IBBD para que eles pudessem se atualizar. Só podia se registrar no curso quem fosse professor de graduação no país.

Todas as matérias seguiram os padrões internacionais.  O objetivo era trabalhar por uma melhoria profissional que se refletiria na qualidade dos serviços prestados pelos profissionais da área e também, ao mesmo tempo, para os professores exercerem seus mandatos legitimamente e dentro das vivências exigidas pela Capes para a existência de um curso de pós-graduação. Era preciso que o PPGCI trouxesse novas reflexões de conceitos que na época ainda não existiam no Brasil. O conceito de Ciência da Informação utilizado em outros países ainda era incipiente no Brasil. 

Então foram convidados professores como Derek Langridge, Jack Mills, LaVahn Overmeyer, Tefko Saracevic e Wilfrid Lancaster, provenientes de universidades dos Estados Unidos e da Inglaterra. Eles trouxeram a bagagem de toda a literatura que era necessária para cursos que não existiam no Brasil. Posteriormente, também foi constituída uma biblioteca especializada no PPGCI. Após a criação do PPGCI, em 1970, durante a minha presidência fui selecionada para um curso de direção da biblioteca e arquivos da Unesco em Paris e eu fui em 1972, onde permaneci até 1991, o que fez com que eu tivesse que me afastar do PPGCI. 

Eu tive o privilégio de ser orientadora de duas grandes referências na área. Uma que é Hagar Espanha Gomes e a outra que é Yone Chastinet. Depois da minha temporada fora do Brasil, eu não imaginava que eu voltaria para a coordenação do PPGCI tantos anos passados, o que aconteceu entre 2008 e 2011, a partir de um convite do professor Emir Suaiden. Ele me fez um convite naquela época para que eu assumisse a coordenação de ensino e pesquisa para a transição do PPGCI da Universidade Federal Fluminense (UFF) para a UFRJ. No ano 2008, foi realizada uma mudança curricular total, agregando professores da UFRJ e a contratação de novos professores pelo Ibict, abrindo espaço para novas disciplinas. Nesse mesmo período foram criados os seminários de informação científica, que continuaram com grande sucesso.

Ibict: A senhora poderia dar algum conselho para os cientistas da informação?

Célia Zaher: Meu conselho é que os cientistas da informação se atualizem sempre. A atualização é muito importante na formação. Recomendo que os cientistas da informação não estudem e participem apenas pelos materiais e seminários nacionais, repetindo o que já é feito nacionalmente. Além da literatura nacional, é preciso sempre conhecer a literatura internacional, a qual pode oferecer outros campos de atuação. Nesse contexto, as bibliotecas também precisam se atualizar. Hoje em dia, é possível ler tudo o que se publica no exterior graças aos repositórios digitais, daí a importância dos repositórios. Sendo assim, a impossibilidade de sair do país não é mais desculpa para não ler literatura internacional.


Patrícia Osandón
Núcleo de Comunicação Social do Ibict

Última modificação em Sexta, 13 Novembro 2020 12:56
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