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Segunda, 28 Setembro 2020 16:07

Entrevista com a professora Gilda Olinto: por uma ciência mais inclusiva

Arte: Victor Silva Arte: Victor Silva

A inquietação surgida a partir da percepção das desvantagens enfrentadas pelas mulheres para ingressarem nas carreiras científicas fez com que a professora Gilda Olinto de Oliveira buscasse ampliar as discussões em relação às oportunidades para as mulheres na ciência. Entre as ações que contam com a atuação de Gilda Olinto está o projeto “Diferenças de gênero na opção por ciência e tecnologia: permanências e mudanças na escola básica”, um estudo com foco nos alunos do ensino médio do colégio Pedro II, no Rio de Janeiro.

Gilda Olinto é membro do corpo docente permanente do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação, realizado a partir da parceria entre o Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (Ibict) e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A professora é graduada em Sociologia e Política pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, tem mestrado em Ciência Política pela Universidade de Michigan e doutorado em Comunicação e Cultura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Em entrevista para o site do Ibict, Gilda Olinto conta sobre a atuação nas pesquisas envolvendo gênero e ciência, detalha a história dela no PPGCI/Ibict/UFRJ e ressalta o papel das bibliotecas públicas.

Confira!

Ibict: Poderia contar um pouco sobre seus temas de pesquisa?

Gilda Olinto: Em relação aos meus temas de pesquisa, começo pelo atual – Mulher, Ciência e Tecnologia – e apresento brevemente um projeto em andamento com o título “Diferenças de gênero na opção por ciência e tecnologia: permanências e mudanças na escola básica”, que recebe financiamento da FAPERJ (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro). Trata-se de um estudo com foco nos alunos do ensino médio do Colégio Pedro II, que tem convênio com o Ibict para a realização de pesquisas, sendo que este projeto específico desenvolve-se em parceria com Silzane Carneiro, que chefia o LAEDH, o Laboratório de Estudos em Direitos Humanos do colégio.

Como o título do projeto sugere, o interesse é conhecer por que ainda permanecem grandes diferenças de gênero na escolha de carreiras, especialmente o fato de as meninas rejeitarem as ciências exatas e tecnológicas. As indagações da pesquisa e estudos sobre o tema nos levaram a considerar alguns dos possíveis condicionantes socioculturais dessas diferenças de gênero, como a presença de estereótipos. Entre as evidências empíricas visadas pelo projeto, destaco um survey que já foi aplicado a 285 alunos da unidade Centro, por sorte no final do ano de 2019, agora em fase de análise. No contexto deste projeto, também já foram organizadas atividades de divulgação científica.

Sobre a inclusão das mulheres na ciência, pode-se dizer que há duas grandes preocupações: a primeira é o seu ingresso mais efetivo nas diversas carreiras de Ciência e Tecnologia e a segunda são as dificuldades de progressão nas carreiras quando elas nelas ingressam, pois enfrentam preconceitos e discriminações que dificultam a sua ascensão profissional. Abordei essas questões em artigo publicado no periódico “Inclusão social”, do Ibict.

Em relação à progressão das mulheres na ciência, tenho realizado trabalhos em parceria com Jacqueline Leta, que liderou projetos e coletou dados da CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) sobre os professores/pesquisadores dos programas de pós-graduação no Brasil. Esses trabalhos consideram as diferenças de gênero nas tarefas acadêmicas como fatores que poderiam explicar as diferenças de gênero na produtividade. Em eventos anuais da “International Society for Information Science”, apresentamos trabalhos sobre esses estudos, focalizando inicialmente o conjunto de professores/pesquisadores nesses programas, e, posteriormente, os de pesquisadores dos Institutos de Pesquisa Nacionais. As análises desses dados indicaram algumas diferenças de gênero em algumas áreas acadêmicas e, surpreendentemente, mostraram que a produção das mulheres supera a dos homens nos institutos de pesquisa do país.

O peso do gênero no acesso e uso das TICs tem também motivado alguns trabalhos meus, em parceria com alunos e com Sonoe Sugahara, professora da ENCE/IBGE. Utilizando dados das PNAD, esses trabalhos abordam as diferenças de gênero no acesso e uso das Tecnologias da Informação e Comunicação entre jovens e entre professores e profissionais da informação. Tenho levado esses trabalhos ao evento internacional European Conference of Information Literacy, que publica uma coletânea organizada pela Springer.  

A origem do meu interesse nos estudos de gênero está na minha tese de doutorado, que abordou aspectos semelhantes aos considerados atualmente, também tendo como campo de estudo o colégio Pedro II, há muitos anos. Mas esse retorno às origens é certamente um grande estímulo, tanto pela observação das “permanências” quanto das “mudanças” nesta grande instituição de ensino nacional.

Ibict: Como foi que se deu a entrada da senhora no PPGCI/Ibict/UFRJ? Qual a sua principal contribuição para o programa?

Gilda Olinto: Entrei para o Ibict para trabalhar como professora do PPGCI, assumindo a disciplina de Métodos de Pesquisa. Certamente, a minha formação nesta área, um aspecto destacado do meu curso de Ciência Política da Universidade de Michigan, contribuiu para meu ingresso no programa. Comecei lecionando metodologia de pesquisa no mestrado e no antigo curso de especialização, o CDC, e ainda ministro a disciplina na pós-graduação. Considero que minha preocupação com o rigor no processo da pesquisa, lecionando a disciplina de metodologia, é talvez o que melhor define a minha contribuição para o programa.

Ibict: Qual a importância do PPGCI/Ibict/UFRJ para a Ciência da Informação?

Gilda Olinto: O PPGCI/Ibict/UFRJ destaca-se como primeiro curso de Pós-graduação (lato e stricto sensu) em Ciência da Informação no país. Considero que o curso sempre teve e continua a ter muita influência na área, inclusive pela evolução do foco dos seus estudos, atualmente destacando-se em abordagens críticas de aspectos epistemológicos, políticos e sociais da informação e da ciência, com atenção ao diagnóstico e análise dos “grandes dados”.

Ibict: Como promover a inclusão das mulheres nas carreiras de ciência e tecnologia no Brasil? Quais medidas podem ser tomadas para superar essas diferenças?

Gilda Olinto: Certamente, as iniciativas da sociedade reivindicando mudanças por meio de políticas públicas são importantíssimas, como o “Parent in Science”, que tem conseguido ganhos, como mudanças em editais públicos que levam em consideração o estágio da maternidade.

Algumas das iniciativas públicas nesse sentido deveriam incluir: o incremento do financiamento de pesquisas sobre esse tema; projetos voltados para desconstrução dos estereótipos de gênero em escolas públicas, incluindo, especificamente, aqueles que buscam mudar a autoimagem das meninas em relação às ciências exatas; promoção de palestras de mulheres cientistas de destaque em escolas públicas; e projetos de inclusão de professoras nas ciências exatas. Iniciativas desse tipo são importantes, não apenas por questão de justiça.

Internacionalmente, como nos países da UE, esse tipo de política tem sido valorizada devido à importância que assumem as carreiras de C&T na sociedade do conhecimento. Abordar esse tema não é uma “questão de gênero”, trata-se de desperdício de talentos, afetando o futuro dos países.

Ibict: Em sua trajetória de pesquisa, entre vários temas, a senhora também tem estudado as bibliotecas públicas. Quais seriam o futuro e os desafios para as bibliotecas públicas no país?

Gilda Olinto: A biblioteca pública como tema de estudo decorreu do meu interesse pelos estudos sobre informação para a comunidade. Ministrei disciplinas sobre este assunto e desenvolvi um projeto de pesquisa sobre a importância da biblioteca pública na democratização do uso das Tecnologias da Informação e Comunicação e no desenvolvimento comunitário. A mais gratificante experiência em tal contexto foi a orientação de teses de mestrado e doutorado sobre o tema, trabalhando com alunos que têm grande vivência dessas bibliotecas e a oportunidade de pôr em prática inovações no sentido da dinamização da relação biblioteca-comunidade. Por meio deles, sinto-me contribuindo para a biblioteca pública brasileira.

Os desafios para o futuro das bibliotecas públicas são muitos devido à pouca atenção dada a essas instituições, assim como a sua pouca visibilidade, tanto por parte do poder público, quanto por parte das suas comunidades. Entretanto, elas ainda são a instituição cultural mais presente em todos os municípios brasileiros e deveriam ter mais chances para desempenhar seu papel nas suas comunidades, que deveriam ter mais voz nas ações das suas bibliotecas.


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Esta entrevista integra uma série do mês de setembro em homenagem aos 50 anos do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação, desenvolvido por meio de convênio entre a Universidade Federal do Rio de Janeiro e o Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia. A série destacará o trabalho das mulheres na vanguarda do PPGCI/Ibict/UFRJ.


Patrícia Osandón
Núcleo de Comunicação Social do Ibict

Última modificação em Segunda, 28 Setembro 2020 16:48
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